O lírio-aranha-vermelho (Lycoris radiata), conhecido no Japão como Higanbana (彼岸花), é uma flor de aparência exótica e intensa, frequentemente associada à morte, despedidas e reencarnação. Com pétalas longas e curvadas, que lembram chamas vibrantes, essa flor floresce no início do outono, geralmente ao redor de cemitérios, templos budistas e estradas rurais. Sua presença nesses locais fez com que, ao longo dos séculos, adquirisse significados profundos e, por vezes, sombrios na cultura japonesa.
Origem do nome e ligação com o mundo espiritual

O nome Higanbana pode ser traduzido como “flor do equinócio”, referindo-se ao Higan (彼岸), um período budista que ocorre durante os equinócios de outono e primavera.
Nessa época, acredita-se que o véu entre o mundo dos vivos e o dos mortos se torna mais tênue, facilitando a comunicação espiritual. Por isso, a flor está diretamente ligada à ideia de transição entre esses dois planos da existência.
Além disso, a Higanbana também é chamada de Manjushage (曼珠沙華), um nome presente em escrituras budistas para descrever flores celestiais que caem do céu antes de eventos importantes. Essa associação reforça seu simbolismo de transformação e destino inevitável.
Simbologias da Higanbana no Japão

O lírio-aranha-vermelho carrega uma variedade de significados, tanto espirituais quanto culturais, sendo retratada em lendas, crenças populares e até mesmo na literatura e no entretenimento japonês. Confira os 3 principais:
1. Laços Cortados e Amores Perdidos
Uma das interpretações do lírio-aranha-vermelho está relacionada a relações destinadas a terminar. Segundo o folclore japonês, se duas pessoas veem essa flor juntas, isso é um sinal de que seu destino será separado, seja pela morte, seja por circunstâncias inevitáveis.
Essa visão melancólica da flor fez com que se tornasse um símbolo de amores impossíveis ou fadados à tragédia, como ilustrado na Lenda dos Amantes Separados – Manju e Saka.
Em tempos antigos, dois espíritos celestiais chamados Manju e Saka foram designados pelos deuses para cuidar da Higanbana. Manju era responsável pelas flores, enquanto Saka cuidava das folhas. No entanto, para cumprir seu dever divino, os dois nunca poderiam se encontrar.
Por séculos, Manju e Saka trabalharam separadamente, sem saber da existência um do outro. Contudo, em certo momento, acabaram se conhecendo e, ao admirarem o trabalho um do outro, se apaixonaram profundamente. Rompendo as regras divinas, passaram a se encontrar secretamente sempre que podiam.
Ao descobrirem isso, os deuses, furiosos, os castigaram com uma maldição cruel: a partir daquele dia, as folhas e as flores da Higanbana nunca mais apareceriam juntas ao mesmo tempo. Assim, Manju e Saka jamais poderiam se reencontrar. Essa maldição persiste até hoje: a Higanbana floresce no início do outono, mas suas folhas só crescem depois que as flores murcham, simbolizando sua eterna separação.
Outra lenda, A Maldição da Higanbana – A Flor das Separações Trágicas, reforça essa associação com o destino infeliz dos amantes.
Conta-se que há muito tempo, um casal apaixonado se encontrava diariamente em um campo coberto por Higanbanas. Prometiam que ficariam juntos para sempre, independentemente das circunstâncias. No entanto, um dia, um evento trágico os separou.
Algumas versões dizem que o homem foi morto em uma guerra, enquanto outras dizem que ele se perdeu no caminho e nunca mais voltou. Devastada, a mulher chorou tanto que suas lágrimas tingiram as flores de vermelho-sangue.
Desde então, acredita-se que a Higanbana se tornou a flor das despedidas e da tristeza eterna. Segundo a superstição, se alguém presentear outra pessoa com uma Higanbana, os dois nunca mais se verão ou sofrerão um destino infeliz juntos.
Essa crença faz com que a Higanbana raramente seja usada em buquês de casamento ou presentes românticos.
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2. Flor da Morte e das Despedidas
No budismo japonês, acredita-se que, após a morte, todas as almas devem cruzar um rio chamado Sanzu no Kawa (三途の川), que separa o mundo dos vivos do mundo dos mortos. Segundo a lenda, as margens do Sanzu no Kawa são cobertas por Higanbanas vermelhas, guiando as almas ao seu destino final.
A flor, então, simboliza a inevitabilidade da morte e a separação definitiva dos vivos e dos mortos. Algumas superstições dizem que se uma pessoa vir muitas Higanbanas ao longo de um caminho, isso pode ser um presságio de morte iminente. Por isso, muitos evitam plantá-la perto de casa.
3. Proteção Espiritual e Mística
Apesar de sua fama sombria, a Higanbana também possui um aspecto protetor. Suas raízes contêm toxinas naturais que afastam pragas e predadores, motivo pelo qual os japoneses costumavam plantá-las ao redor de arrozais e casas para proteger plantações e lares. Algumas tradições dizem que a flor também pode afastar espíritos malignos e energias negativas.
Hoje, a Higanbana continua sendo uma das flores mais emblemáticas do Japão, presente em cemitérios, festivais de outono e diversas obras da cultura pop, evocando um sentimento de melancolia e reflexão sobre o destino e a efemeridade da existência.
Então, enquanto muitas dessas lendas são populares no Japão, algumas têm raízes em tradições budistas e folclores chineses e coreanos. No entanto, o forte simbolismo da Higanbana como “flor da morte e das despedidas” é algo que se consolidou principalmente na cultura japonesa.
A Higanbana na Cultura Pop Japonesa
Devido ao seu forte simbolismo, a Higanbana aparece frequentemente em animes, mangás e filmes japoneses, muitas vezes associada a personagens ou momentos de tragédia, despedida e transformação. Alguns exemplos marcantes incluem: Inuyasha, Tokyo Ghoul, Dororo, Demon Slayer (Kimetsu no Yaiba), Lycoris Recoil e Hell Girl (Jigoku Shoujo).

Além dos animes, a Higanbana também aparece em diversas obras literárias, músicas e até mesmo em festivais de outono, como o Higanbana Matsuri, que celebra sua beleza efêmera e significado espiritual.